Há uma certa cadência na maneira como ela confirma apertando os olhos que está cansada, levando a costa da mão esquerda à testa. É tudo tão leve como plumas. E plumas você não encontra tão fácil por aí. Poeira sim. Qualquer foto sairia carregada de sutileza e delicadeza, eza, ezas, mas não gosta que a fotografem, é tímida.E isso a torna ainda mais e mais. Os cílios enfileirados, as unhas corretíssimas. Digo que não entendo aquele ar de sofrimento, prestes a desfalecer. O meu drama é com palavras o dela é pele.
Os móveis baixos e amadeirados. Cair na cama te distanciava do teto e eu estendia assim o braço e caia para trás. E Laura ali, loira, loira como um pintinho, encolhida no canto do quarto. Mas...quem te fez isso? E você espera sangue mas eram fios finos e longos. Desculpa, eu...Não precisa chorar. Me dá sua mão. E é aquela mão de leite, aquela unha que não cresce. O sol entra tímido pela veneziana que insiste em ser verde. Já faz duas semanas que a poeira vem se aprumando, logo vai reinar. Estou aflito. Laura também já percebeu. Hoje os últimos biscoitos da lata. Ela me olhou após tomar o copo de leite, dente de leite. Quando vi, tinha pegado a tesourinha de costura, cortou tudo, pintinho. Você espera sangue, mas essa dor injetada precisa ser sólida? Vem cá, Laura, levanta daí, vamos fazer biscoitos? É linda, como mamãe. Os móveis baixos, tão perto de nós. Nenhum bilhete. Laura sorri e a mim basta.
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