Merdas, plural. O que ela deixava sair pela boca era lixo, balelas. Eu me concentrava a olha-la, podia sentir seu gosto só de olha-la. Veio uma pomba cair entre nós, dividiu nossos passos e ela inventou de falar sobre o pombo-correio. Pombo-correio o caralho. E não me olhava. De repente sorriu e a boca entortou. Queria amá-la ali mesmo, no meio do mundo com tudo que tinha e podia mas não podia nada. Desviei, ela teria percebido? Não, agora estava longe, estava em Vênus decidindo passar o resto da vida sozinha.
Os móveis baixos e amadeirados. Cair na cama te distanciava do teto e eu estendia assim o braço e caia para trás. E Laura ali, loira, loira como um pintinho, encolhida no canto do quarto. Mas...quem te fez isso? E você espera sangue mas eram fios finos e longos. Desculpa, eu...Não precisa chorar. Me dá sua mão. E é aquela mão de leite, aquela unha que não cresce. O sol entra tímido pela veneziana que insiste em ser verde. Já faz duas semanas que a poeira vem se aprumando, logo vai reinar. Estou aflito. Laura também já percebeu. Hoje os últimos biscoitos da lata. Ela me olhou após tomar o copo de leite, dente de leite. Quando vi, tinha pegado a tesourinha de costura, cortou tudo, pintinho. Você espera sangue, mas essa dor injetada precisa ser sólida? Vem cá, Laura, levanta daí, vamos fazer biscoitos? É linda, como mamãe. Os móveis baixos, tão perto de nós. Nenhum bilhete. Laura sorri e a mim basta.
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